quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

O AMANTE E O AMOR SÃO UM SÓ


Que temor deverá o vero amante pelo caminho nutrir,
uma vez que o ser eterno é o companheiro da viagem?
Que pesar poderá ele sentir na partida da alma,
quando o Deus de sua alma é o mais íntimo amigo?

Ele é um viajante; no entanto, como a lua,
permanece imóvel em sua própria beleza.
Como poderá esperar pela chegada da brisa,
sendo ele mesmo mais leve que qualquer aragem?

O amante e o amor, alma minha, são um só:
nunca os julgues como duas metades.
Quando o amor e o amante se perceberem um só,
ao mesmo tempo ambos serão o dador e a dádiva. 

O amante está em busca desta completude;
ele é como o couro posto ao sol a maturar. 
Quando parte para o mar à procura da pérola,
é ele mesmo essa pérola, única e inestimável.  





Rumi (1207 - 1273)






(Versão de Pedro Belo Clara a partir da tradução inglesa de Andrew Harvey in "Teachings of Rumi" - Shambhala Pub., 1999)














quinta-feira, 7 de dezembro de 2017

SEGUNDA VISITA A XIANGYANG (COM PASSAGEM PELA VELHA CASA) *


Há muito tempo atrás, quando cheguei a Xiangyang,
havia apenas começado a deixar crescer o bigode.
Agora, de novo em Xiangyang, 
já tenho as patilhas e o bigode grisalhos.

Todas as memórias daquela viagem são hoje um sonho:
chegara apressado, e cheio de pressa ao lar retornei.

Aquela casa com telhado de palha, a este da muralha,
meio desfeita - quem nela agora habita?
A maior parte dos velhos amigos dispersou-se 
e desapareceu. Até a povoação mudou de lugar.

Apenas as águas outonais do rio,
cobertas pela neblina, ondulam como outrora.





Bai Juyi (774 - 846)







(Versão de Pedro Belo Clara a partir da versão inglesa proposta por Burton Watson.)








(*) Xiangyang situa-se na província chinesa de Hubei, embora já não exista com total individualidade. Tendo sido unida à cidade (Fancheng) da margem norte do rio que a ambas servia de fronteira, dá hoje pelo nome de Xiangfan. Onde em tempos dois pólos se ergueram, actualmente um só prevalece. 
O pai do poeta viria a falecer em Xiangyang no ano de 796, no posto oficial local. A "velha casa" que o poema refere seria, por ventura, uma antiga habitação familiar, embora Bai Juyi não dê a entender que ele tenha nela feito residência. O rio que nos planta a imagem final do poema é o Han, que como já se sabe atravessa nos dias de hoje a nova cidade de Xiangfan. 










(Muralha da antiga Xiangyang, sobranceira ao rio Han)