sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Três poemas de Wang Fan-chih (1)


I. 

Mendigar pode prover uma boa vida,
levar-te para além da fome e do frio.
As cabeçorras rapadas destes monges taoístas
vivem sobre belas e rechonchudas bochechas. 


II.

Nunca houve um pai e um filho tão próximos 
quanto aqueles dois. Mil moedas de oiro 
não compravam um olhar duvidoso 
ou uma palavra maldosa de um sobre o outro.
Ainda assim, quando um deles 
de súbito adoeceu, tendo morrido, o outro 
afastou-se e permaneceu bem longe,
temendo pela sua própria vida.


III.

Poderão algum dia voltar a casa?
Labuta sem fim:
esposas em trabalhos forçados,
maridos reunidos à força,
rumo à guerra.






Wang Fan-chih (séc. IX) 





(Versões de Pedro Belo Clara a partir das traduções de J.P. Seaton, in "Cold Mountain Poems" - Shambhala Publications, 2009)






(1) Conforme foi dito numa publicação anterior, regressa-se a este autor com uma breve selecção de poemas que espelham o seu lado mais crítico sobre a sociedade e o mundo, constantemente regado pela ironia que o caracteriza. Expõe o ridículo, a injustiça e a incoerência humana de modo simples e directo, sem lugar para desculpas ou hesitações. Graças a este olhar, uma imagem mais clara do tempo que viveu é-nos dada com uma limpidez louvável. Assim nasce a incómoda constatação que, à parte a era e o lugar, pouco terá mudado com o render dos tempos...
















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